Lauro Fabiano |
A música faz parte da existência humana desde que os hominídeos começaram a bater madeiras e pedras. Os ritmos musicais não podiam ser gravados nas paredes das cavernas, mas, não há dúvida que a musicalidade é ancestral, primordial e sempre presente em qualquer tipo de cultura. Eu adoro Bach, Mozart e Verdi. Mas tem horas que adoro mais Pink Floyd e Led Zeppelin. A poesia das canções do Caetano Veloso faz com que esqueça a mediocridade dele ao abrir a boca sem ser para cantar. Entre cantos gregorianos e batida de atabaques, prefiro os dois até porquê não estou nem aí para as divindades que sejam invocadas por tambores ou que apareçam em sarças ardentes. Tudo depende do momento, da companhia, da cabeça e da disposição. Embora muitos pedantes digam que ser eclético é não ter certeza do que gostar, sinto que a velha máxima se aplica: cada um na sua. Existem ritmos ou tendências que não aprecio muito ou em momento algum. Por exemplo, essa estética musical que se denomina hoje "sertanejo" e que não tem absolutamente nada com as músicas das raízes do campo, de uma gente sofrida que cantava sua simplicidade, sua miséria, seu trabalho ou sua alegria apesar de todas as adversidades de um país que sempre olhou com desconfiança e desprezo para o trabalhador da terra. Esse som que mistura dor-de-corno com sensualidade exacerbada (sem chegar nas raias do funk) e que faz a festa em carros "tunados", botecos de subúrbio e barzinhos específicos para o gênero. Assim, entre Luan Santana e o Lua, respeito e escuto nosso velho e bom sertanejo Luiz Gonzaga.
Mas, Edson Petenussi, em sua viagem de moto desde São Paulo até Uchuaia - literalmente o fim do mundo - foi parado ao sair do Chile e entrar na Argentina. A agente da fronteira ao olhar os documentos perguntou: "És de Brasil?". Edson disse que sim. Ela pede então para ele explicar o quê é "NÔZA". Ele faz cara de "pois é", ou seja, não tinha a mínima ideia do que ela dizia. Então a oficial começa: "Nôza, nôza, así usted me mata, ah se te piego ah ah se te piego..." Leio isso e vejo no Facebook que tal música já está nas paradas de sucesso da Polônia. A "letra" é fraquíssima. A melodia, um aprendiz compõe. Mas deu certo. Em uma época de sucessos rápidos, de carreiras meteóricas, onde o importante é "emplacar", eles emplacaram. Eu não sei nem o nome de quem canta, se é solo ou se é um conjunto. Sei que na festa da empresa tocou e eu dancei. O Johnnie Walker ajudou, claro, mas dancei. Então, para que gastar linhas para falar mal ? Não, falemos bem. "Assim você me mata" ou qualquer que seja o nome, é um sucesso. Aqui e onde chegar. O rítmo é bom, faz querer dançar. A ideia é mexer com a libido - dá certo.
Sem dúvida que isso me faz lembrar do Pestana, de Machado de Assis, no conto "Um Homem Célebre". A frustração entre fazer sucesso com coisas populares ou ser reconhecido pelo que considera uma manifestação mais elevada de arte não é contemporânea. Hoje, o importante é fazer sucesso, ganhar dinheiro enquanto pode e depois curtir no ostracismo os 15 minutos de fama que foram embora. Despudoradamente sem frustrações ou angústias. A mulher "fruta" que coloca um biquíni minúsculo e balança o corpo nos "reality shows" faz um equilíbrio perfeito com quem se coloca defronte à TV para assisti-la. Não pode ser gente séria, de qualquer lado que se esteja. Mas, em terra de cego, quem tem um olho diz que tem os dois e pisca o que não tem. É assim nesse tipo de "música-imagem", cujo apelo e sentido são, acima de tudo, comerciais.
Mas podemos ter diversão em tudo, não ? Imagine o Serra cantando em sua mansão, pensando no Amaury: "Ai se te pego, ai ai..."
Um comentário:
Acho que o blogue só se enriqueceu com teu ingresso nele.
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